terça-feira, 6 de setembro de 2011

Dia do Sexo com Beijo!


Os dois deviam ter de 16 para 17 anos, mas já sabiam como funcionava um namoro e o que era preciso fazer para que seu companheiro ou companheira estivesse sempre satisfeito. Quer dizer, pelo menos é o que eles achavam. Um adulto certamente diria que o que os dois sustentavam um pelo outro era apenas uma forte paixão, ocasionada pelos hermônios que ferviam dentro do sangue deles, que os faziam ter tanta vontade de tocar um ao outro. Talvez fosse isso mesmo, ou talvez não.

Mas, sim, os hormônios dos dois estavam à flor da pele. Para eles, aquele namoro significava uma satisfação mútua, era como completar o quebra-cabeça de vontades deles, era se sentir completo. Entretanto, além disso, significava também a realização de fantasias sexuais.

Calma, calma, calma. Não estou falando de nenhuma fantasia sexual elaborada demais, afinal, precisamos lembrar que os dois têm apenas 16 para 17 anos. Nessa idade, onde a cabeça humana é tão madura quanto uma manga verde, fantasia sexual pode ser qualquer coisa que os faça sentir-se em perigo ou exposto. No caso desse casal, eles estavam expostos.

Eles se beijavam no banco de um corredor de um movimentado - bem movimentado - shopping.

Sim, eles se beijavam. Para quem visse de fora e não desse muita atenção, aquilo era apenas um beijo, entretanto, a moça sentada ao lado deles, aquela com o sorvete na mão, sentia o constragimento que se sente ao estar, por exemplo, assistindo a uma cena de sexo com um filho ao lado. Aquela cena não era uma cena de sexo em seu sentido literal, e também o seu filho não estava por ali, mas essa comparação foi uma metáfora que coube perfeitamente ao beijo tão caliente e ao grande número de voyeures ao redor.

Eles podiam não estar fazendo sexo, mas é claro que aquele beijo era uma relação sexual.

Os dois eram adolescentes de classe média alta, estudavam de tarde numa escola técnica, não precisavam e não podiam trabalhar, portanto, simbolizavam o que seria o jovem da era moderna, aquele ser descolado que só consegue ser descolado à custa dos pais. Tanto é que eles mal tinham dinheiro para se sustentar quando pensavam em sair juntos. Não tinham dinheiro para nada, nem para o mesmo sorvete que a mulher ao lado deles tomava. Nem mesmo para pagar o motel em que os dois poderiam estar naquele exato instante.

O casalzinho não tinha lugar onde fazer sexo. No quarto do rapaz, na casa dos pais deles? Não. O irmão pequeno dele jamais permitiria que os dois ficassem sozinhos durante um segundo sequer, assim como sua mãe, que iria sempre perguntar o que poderia fazer para que os dois se sentissem confortáveis. Mas e no quarto da moça, na casa dos pais dela? Jamais! Já pensou o que o pai dela não faria ao rapaz se os deparassem no meio de um rala-e-rola em sua própria casa? Não só ele como a menina também estariam ferrados!

Era exatamente por isso que os dois se beijavam de maneira tão quente em plena rota de caminhada de tanta gente que passeava pelo shopping. Querendo ou não, ser observado por tantos olhares era prazeroso para os dois. Acreditem.

Enquanto o rapaz colocava a língua na boca da outra, ele imaginava que outra coisa estava entrando em outro buraço da moça. Enquanto uma mão sua apertava com paixão o braço dela, ele imaginava seus dedos apertando com a mesma força os seios da menina. A outra mão estava no quadril dela, mas, céus, como ele desejava que escorregasse mais pra baixo e que ele pudesse tocar o que havia por baixo do seu jeans!

E ela então. Enquanto ele a beijava, ele dançava com os quadris, indo para frente e para trás na cadeira, como se não o estivesse beijando, e sim fazendo outra coisa. Sua mão estava na nuca do rapaz, mas porque ansiava pelo momento em que forçaria a cabeça dele para os seus seios e mostraria o quão atraente poderia ser. Enquanto ele dançava no mesmo ritmo que ela, ela fantasiava sobre como seria se os dois estivessem nus, fazendo o mesmo movimento, só que em outro lugar e em outra ocasião.

E, meu deus, como era bom ser observado por toda aquela gente!

É por isso que tanta gente faz cara feia quando vê um casal se beijando. Beijo em público significa sexo, e nem todas as pessoas que estão ao redor se sentem confortáveis assistindo isso. Ser discreto é importante e bonito.

Tire como exemplo a moça que tomava o seu sorvete ao lado desse casal.

sábado, 30 de julho de 2011

Molde-me Para Me Amar? Ahn?


O rapaz tinha certeza de que a amava. Quer dizer, pelo menos era o que seu cérebro lhe dizia. Ele a olhava e pensava "É... Essa pode ser a menina da minha vida, com certeza. Com toda a certeza".

Antes, é claro, ela precisava fazer algumas mudanças.

- Que tal se - ele começou a dizer certeza vez -, você mudasse o seu cabelo? É verdade. Seu cabelo é bom, mas ficaria lindo se fosse loiro. E se fosse cortado com um corte mais moderno. Você é linda, sem sombra de dúvida, mas não acha que seríamos um casal lindo se seu cabelo fosse loiro? Que nem o da Britney Spears, vai? Ela é bonita pra caramba.

A menina, que o amava como nunca, com ternura, com felicidade, aceitou o conselho. E fez a mudança. Pintou os cabelos de louro. Seus amigos notaram a diferença e, é claro, perguntaram porque a mudança drástica. Ela disse que era porque queria ser mais moderna, a sociedade pedia isso, e talvez fizesse bem até pra sua auto-estima. Uma mentira, é claro, afinal, o motivo disso era o menino com quem estava andando, pois em nenhum momento a sociedade havia pedido isso. De qualquer forma, seus amigos nem mesmo questionaram.

Dias depois, o menino notou que a menina que escolhera pra vida era um tanto quieta. Quando saíam juntos, era como se ela não se enturmasse com ninguém em sua turma de amigos, não abria a boca para questionar ou comentar qualquer coisa, o que acabava sendo um verdadeiro vexame para ele. Como forma de querer mudar isso, mas sem ser agressivo, ele a abordou certa vez e disse:

- Queria que você fosse mais amiga. - Ela achou estranho aquilo, mas quis ouvir até o fim. - Queria que conversasse mais com os outros, que falasse mais, fosse mais extrovertida. Opine sobre as coisas, mesmo que não te peçam isso. Vai ser melhor para nós dois. Seremos mais felizes.

Ela, que o amava incondicionalmente, acatou ao pedido e fez essa mudança, que foi bastante demorada. Sempre fora uma garota quieta, que só falava quando necessário, e nunca achou que isso fosse problema. Quer dizer, sua família, e isso incluía desde sua mãe, seu pai e irmã até outros primos e tios, nunca reclamou de nada. Nem mesmo os amigos, que gostavam dela dessa maneira que sempre agira.

Mas se seu parceiro dizia que isso precisava ser mudado, talvez de fato precisasse. E aplicou essa mudança.

Ela era uma garota muito fantasiosa. Quando estava quieta, viajava em diversos pensamentos. Portanto, abrir a boca quando costumava ficar quieta funcionou de maneira inesperada. Quando conversava, o que falava era ouvido com estranheza por todos ao redor. Quer dizer, ela não era de falar muitos palavrões, e falava tão direitinho que, sim, todos acharam estranho. E suas teorias sobre os assuntos eram tão complexas que quase ninguém entendia. Tudo bem que seus amigos não viam problema naquilo, mas os amigos do seu amado viam.

Inclusive ele viu.

- Por favor, seja mais natural! - ele falou e ela até achou um pouco arrogante da sua parte. - Meu deus, você parece uma enciclopédia ambulante falando! Parece um robô, algo assim! Afinal, você tem problemas de personalidade? Não consegue conversar como qualquer outra pessoa?

- Não estou entendendo - foi o que ela disse, e seu coração doeu.

- O que estou querendo dizer é: por que você não muda! Poxa vida, se fosse assim, assim, assado (ela não lembrava com precisão as coisas que ele pediu que ela mudasse), seríamos muito mais felizes! Seríamos o casal perfeito! Nossa relação seria melhor, inclusive as nossas relações sexuais! Teríamos felicidade, finalmente!

- O que está querendo dizer é que eu preciso mudar pra você me ame realmente?

- Isso!

- Então o seu amor por mim não é verdadeiro.

O rapaz arregalou os olhos diante daquilo.

- Você me conheceu de um jeito, disse que me amava - ela prosseguiu -, mas têm exigido tantas mudanças de mim que até parece que não sou perfeita pra você. Você quer me moldar. Você quer que eu seja outra pessoa! Se me amasse de verdade, meus defeitos e qualidades não te importariam, afinal, quem ama ama o que o outro é, não o que ele pode vir a ser.

Olhando-o com repugnância, ela finalizou.

- Não ou um boneco de massinha que você pode mudar quando bem entender. Se me quisesse de verdade, gostaria de mim pelo que sou. Porém, não é esse o caso.

A garota se virou, abriu e bateu a porta da casa do rapaz ao sair e sumiu. Horas depois, estava na companhia de amigos, que realmente gostavam dela da maneira como ela era. E com eles ela não tinha problemas, ah, não. Afinal, aqueles amigos a amavam de verdade. Aquilo era o amor.

E então ela nunca mais voltou a ver o rapaz, pois o que queria, um amor verdadeiro, não era encontrado nele.

quinta-feira, 28 de julho de 2011

A Mentirosa Entrevista de Emprego!


- Qual é o seu nome? - perguntou o homem à minha frente, cujo nome eu não lembrava.

Entrevista de emprego. Lá estava eu, sentado de frente para um homem de aspecto autoritátio, aquele tipo de gente que dá medo de encarar, de causar má impressão, de falar a coisa errada e ser julgado errado. O que eu tinha que fazer era conquistá-lo para que a vaga fosse minha. Era necessário que eu calculasse bem as minhas palavras para que elas agradassem os ouvidos daquele que poderia vir a ser o meu novo chefe.

Me deseje sorte!

- Marcelo Rocha - respondi e sorri. Meus lábios tremularam com dois segundos de sorriso.

- Certo, Marcelo... Vamos começar a entrevista, então. Diga-me algumas das suas qualidades.

Ah, e lá vem a clássica pergunta!

Tenho muitas qualidades! Sei praticar esportes como ninguém - aliás, sou um ás do futebol. Meus amigos sempre querem que eu jogue em seus times em nossas peladas semanais, e eu sempre me saio bem - me garanto com a bola no pé. Poderia dizer que a minha pontaria é excelente, já que muito dificilmente erro algum gol. Se chuto na rede, já era, ponto para o meu time! Também sou um excelente líder, sei como tomar conta do nosso time de futebol - sou um excelente técnico, por assim dizer. Entretanto, no que isso somaria no que diz respeito às qualidades que a empresa procura?

Vou ter que mentir.

- Sou responsável - foi o que saiu da minha boca, porém, cá entre nós, está longe de mim ser uma pessoa responsável. Minhas contas atrasadas e perdas de compromissos diriam isso por mim. - E sou organizado, também - outra mentira. Se meu quarto pudesse ouvir o que estou dizendo, certamente estaria dando uma gostosa e sarcástica risada. As roupas espalhadas em cima da cômoda se sentiriam afrontadas diante de tal afirmação.

- Muito bem, muito bem. E poderia me citar alguns defeitos?

Defeitos? Ah, por favor!

Quem contrataria alguém com defeitos? Vamos combinar, defeitos eu tenho vários! Além da irresponsabilidade e falta de organização, sou preguiçoso. Sim. Acordar cedo é um processo lento e doloroso pra mim, até parece que eu e a cama temos um campo magnético só nosso, onde ela me atrai e eu a atraio, não conseguimos nos desgrudar enquanto a voz estridente da minha mãe não gritar o meu nome. Sou tão preguiçoso que não tomo banho de domingo, já que não faço nada de mais nesse dia. Sou tão preguiçoso que não faço o meu próprio alimento. Sou tão preguiçoso que faço trabalhos de escola de qualquer jeito só para garantir um C e me livrar logo disso. Mas será que isso atrapalharia o fato de eu poder ser escolhido naquele processo seletivo?

Mas é claro que sim! Quem contrataria alguém preguiçoso? Vou ter que mentir.

- Sou perfeccionista - foram as palavras que desenrolaram a partir da minha boca. Ah, a mentira! Onde eu seria perfeccionista, quando não dou a mínima para as coisas, desde que elas sejam práticas? De qualquer forma, quem se importa? Agora ele vai pensar que me importo tanto em fazer um trabalho bem feito que isso acaba sendo um defeito na minha vida. Ponto positivo para mim.

- Certo... - ele falou e seu olhar baixou para o meu currículo. - Fale-me um pouco sobre suas outras experiências profissionais.

Ah, as experiências profissionais...

Menti a maioria delas. Estou para trabalhar numa empresa que presta serviços de contabilidade para outras empresas e vou falar que trabalhei como carregador de galões de água, depois como atendente numa lanchonete do Habib's e até que fiz bico de natal para uma loja de roupas de surf? Jamais! Coloquei que já trabalhei com contabilidade antes, numa empresa não muito longe de casa, onde um amigo meu trabalha. Ele prometeu que me acobertaria caso acontecesse de o entrevistador entrar em contato com ele para verificar a veracidade das informações. Não tem como dar errado.

- Foi uma experiência muito boa - comecei falando. - Eu trabalhava fazendo contas - não existe problema nenhum em falar isso, afinal, todos nós sabemos fazer contas -, eu fazia cartas para os funcionários e para cartórios com o Word - qualquer um sabe mexer no Word, não tenho problema nenhum em afirmar isso -, eu verificava e preenchia planilhas do Excel - bang! Primeiro problema na minha fala: eu não sei mexer no Excel. Se tiver algum teste disso, certamente eu estarei ferrado - e fiz muito boas relações. - Que se dane se isso não for uma boa coisa!

- Está certo...

O entrevistador ficou olhando para o meu currículo durante um tempo que pareceu duas horas seguidas, sem dizer uma palavra sequer. Enquanto isso, eu só ouvia o incessante clic! que ele fazia ao apertar várias e várias vezes o botão da caneta que usava. Depois disso, ele olhou para mim e, sério, falou:

- Entraremos em contato com você.

- Ok. Muito obrigado - falei e me levantei para me retirar.

Não houve contato posterior. Esperei por duas semanas seguidas a resposta, mas não obtive nenhuma. Poxa vida, eu dei as melhores informações possíveis, criei um personagem de funcionário perfeito, que qualquer empresa contrataria, por que não fui chamado?

Será que foi porque menti?

~~~~~~~~~

Moral da história:
Mentir para agradar alguém jamais vai dar certo, pois quem mente não consegue ser natural. Dizer a verdade só lhe traz segurança. Assumir quem você realmente é é uma excelente maneira de cativar quem quer que você queira cativar.

quarta-feira, 8 de junho de 2011

Os Nós do Fone de Ouvido

Linda enrolava o fone de ouvido nas mãos, afinal, sempre fora preocupada com organização e não gostava de perder tempo desenrolando-o. Enquanto isso, pensava no erro que acabara de cometer. Pensava em como fora capaz de cometer um erro tão grande com aquele que tanto amava! Guardou os fones de ouvido no bolso da calça e cruzou os dedos das mãos em frente ao rosto. Tensa, resolveu pegar os fones de ouvido de novo e voltar a ouvir música, que era a única coisa capaz de distraí-la no momento.

Pegou o emaranhado de fios e os olhou por sobre as mãos espalmadas. Algo parecia errado. Como podia um fone de ouvido adquirir vida própria e se enrolar da maneira como estava enrolado? Ela acabara de organizar os fios, como aquilo era possível?

Sem pensar mais no assunto, pôs-se a desatar os nós.

O Pedro pensa que é quem pra me tratar da maneira como tratou? Eu sou a garota da vida dele, como ele pode ser estúpido a tal ponto? Ele vai perceber que errou, vai perceber que me magoar foi o pior erro da vida dele, ele sempre faz isso, não é dessa vez que vai ser diferente!

Os fones continuavam enrolados e, nas mãos de Linda, pareciam um quebra-cabeça a ser solucionado. Com o indicador e o polegar da mão direita, pegou um pedaço de fio de um dos pontos e puxou. Com isso, vários outros vieram com ele, tornando o nó algo ainda mais confuso.

Deve ter sido culpa daquela sirigaita da amiga dele! Sim, aquela puta! Ela não desgruda dele nem um momento, como vou conseguir um minuto sequer ao lado dele? Será que ela não percebe que é um estorvo em NOSSAS vidas e que amigos são muito bons apenas quando cada um está na sua casa? Como é que consegue ser tão ridícula?

Pegou duas pontas de fio e puxou, mas o nó pareceu se aprofundar ainda mais, lembrando o que seria uma complexa teia de aranha, grossa demais para ser levada como real. Respirou fundo e prosseguiu, descrente de que pudesse estar enfrentando um quebra-cabeça tão difícil de ser solucionado. Por que os fones de ouvido têm sempre que se comportar assim?

Não tive como segurar, tive que falar com ele! Mas, é claro, não antes de falar com ela! Quer dizer, falei umas poucas e boas, pedi que se afastasse do MEU namorado, xinguei ela de puta e muito mais, ela chorou, mas eu não posso fazer nada! Não acredito em amizades entre homens e mulheres, tenho certeza de que ela estava dando em cima dele, tanto que nunca mais voltou a falar com ele!

Jogou o emaranhado de fios em cima da mesa e suspirou, frustrada. Encarou a "obra de arte" por mais um instante e, determinada, agarrou o quebra-cabeça, mexendo aqui e ali com o indicador, movimentando fios sobrepostos por superpostos, acreditando que aqueles movimentos finalmente libertariam o fone do nó e ela de um grande tormento.

E agora ele está irritado comigo...

De repente, Linda teve a impressão de que estava próxima de desatar o monte de nós que tinha em mãos. Só precisava fazer os movimentos certos.

É claro que está... Perdeu uma amiga por minha causa. Querendo ou não, acabei influenciando em sua vida de maneira negativa e fiz com que ele perdesse uma pessoa de que gostava muito. Meu deus, como fui cruel? Por que não pensei antes de fazer tamanha cagada? Poxa vida, isso foi tão ruim da minha parte!

Só precisava puxar mais um fio...

Compreendo perfeitamente o nervosismo do Pedro. Fiz com que ele perdesse um de seus grandes amores. Minha nossa, isso não foi bom da minha parte, agora entendo porque ele está tão nervoso comigo...

E soltou o nó.

Eu fui a causadora da nossa separação. Eu fui a causadora do nosso desentendimento. Fui eu que fiz o nosso relacionamento seguir por esse caminho...

Havia sido Linda quem fizera o nó em seus fones de ouvido.

Largando os fones desorganizadamente em cima da mesa, Linda correu até o telefone. Da mesma forma como acabara de desatar o nó que ela mesma havia feito, agora queria resolver uma situação delicada que ela mesma havia criado.

segunda-feira, 6 de junho de 2011

A Morte Mais Bonita da Cidade

~Dê play nisso antes de começar a ler~

A mão dela estava fria, segurando a dele com muito esforço. O que motivava o gesto era o amor que sentia por aquele que agora lhe olhava de cima, como um deus assistindo a todo um mundo. Aliás, era provável que Deus estivesse naquele quarto, pois ela sabia que sua hora estava chegando. A mulher deitada na cama, assistida pelo seu marido, que segurava com todas as forças o choro para não demonstrar fraqueza, estava doente. Pior do que isso, estava à beira da morte e tinha total consciência disso.

Mas estava bem.

Olhou ao redor do quarto, aquele que dividira com o apaixonado marido por quatro curtos anos, e sentiu nostalgia. Estava para deixar tudo aquilo, pensava, e não sentia nenhuma tristeza grande por isso. Quer dizer, gostava daquele ambiente, mas o sentimento de estar para morrer a confortava. E, de alguma forma, queria todos ao seu redor, no caso, o seu marido, estivessem como ela, tranquilos.

Ouviu alguém chamar o seu nome e teve certeza de que a hora estava próxima.

- Amor... - sussurrou com dificuldade para o homem ao seu lado na cama. - Posso te pedir uma coisa antes de partir?

- Meu deus, não fale assim! - ele implorou. - Os médicos estão a caminho!

- Por favor, me conceda esse favor...

- Não fale assim...

- Cante pra mim uma música.

- U-Uma música?... Qual música?

- Oração... - ela falou e respirou fundo. Falar doía muito no seu peito. - Aquela da... da Banda Mais... - não conseguiu terminar, lhe faltou fôlego. Respirou fundo e prosseguiu: - Você conhece, amor...

Ela está delirando, pensou o homem. Entretanto, achou justo o pedido da mulher e aceitou cantar a música. Não sabia se conhecia a letra inteira, mas achou que poderia tentar se começasse. Teve a impressão de que iria chorar em poucos segundos. Abriu a boca e, com a voz rouca, entoou:

- ♪ Meu amor, essa é a última oração, pra acalmar seu coração - passou a mão no peito da mulher, que subia e descia num ritmo mórbido. - ♪ Coração não é tão simples quanto pensa, nele cabe o que não cabe na dispensa, cabe o... - não conseguiu segurar uma lágrima, que se desprendeu e caiu solenemente sob o busto da mulher. - ♪ Cabe o meu amor... Cabem três vidas inteiras... - Acabou se lembrando do filho, que agora estava com a vó, uma maneira de privá-lo da dor de ver a mãe partir. Mais uma lágrima. - ♪ Cabe uma penteadeira... - Sem perceber, se virou para a penteadeira, que ficava de frente para a cama. Ali, aquele lugar, era o que sua mulher mais amava! Era onde passava horas se arrumando, afinal, sempre fora vaidosa. Além do mais, ali se encontrava a bíblia, aquela que lia quando se sentia triste, aquela que lhe dizia tudo o que precisava saber. Meu deus, essa música é pra ela... - ♪ Cabe nós dois... Cabe até o meu amor, essa é a última oração, pra acalmar seu coração, coração não é tão simples quanto pensa - Sorrindo e chorando muito, passou mais uma vez a mão sobre o peito da mulher, que também sorria e chorava, mas com alegria. - ♪ Nele cabe o que não cabe na dispensa, cabe o meu amor...

Não se sabe ao certo quanto tempo o homem cantou a música para a sua mulher, mas uma coisa era certa: não foi tempo suficiente para que pudesse cantar quarenta e quatro vezes os mesmos versos, como a música original era cantada. Antes disso, a mão da mulher na sua afrouxou, os olhos dela se fecharam, o sorriso permaneceu estampado em seu rosto.

Sua mulher acabava de morrer.

O homem respirou fundo, o corpo tremia com algum sentimento que não sabia explicar. Estava profundamente emocionado, oh, como estava! As lágrimas cessaram por um instante, e, pensativo, ele encarou a mulher que deixara a vida. Seu semblante parecia querer dizer algo, mas o quê?

"Não fique triste", ouviu a voz da mulher dizer na sua mente. "Eu estou feliz, olha como sorrio".

Ainda com o refrão de "Oração" na mente, o homem abraçou com força sua mulher e chorou. Não estava chorando de tristeza, chorava de alegria. Pensava em como ela tinha sido sábia em escolher aquela música, aquela com letra tão peculiar, para ouvir antes de partir. Agora entendia porque ela gostava da música, ela lhe trazia algo bom.

O homem não mais ficou triste. Por mais que tivesse perdido a mulher, lembrou-se de que ela ainda estava no seu coração e jamais sairia dali. Sorriu ainda mais e se sentiu cheio de vida. Não perdera a mulher que gostava, e jamais perderia.

O corpo de sua mulher estava sem vida, mas, para ele, era como se isso não tivesse nenhuma importância. É assim que ela quer que eu me sinta, portanto, feliz é como todos me encontrarão. E deixou o quarto para dar prosseguimento com as papeladas do velório.

quinta-feira, 2 de junho de 2011

À Moda do Amor Dele


Nunca fui muito boa ou segura em questões de relacionamento, mas a vida me mostrou que eu estava simplesmente agindo de forma errada. Quer dizer, pelo menos no que diz respeito aos meus padrões, e isso engloba o fato de eu ser uma menina linda, de cabelos castanhos e ondulados de causa inveja, de andar sempre bem maquiada e com as melhores roupas, que sempre acompanham a moda. A minha intenção nunca foi chamar a atenção de ninguém; se eu comprava roupas bonitas e da moda, ou alguma tendência, era pelo simples fato de eu achar a roupa bonita. E assim cresci.

Hoje tenho os meus 17 para 18 anos e, num piscar de olhos, percebi que sou desejada. Os meninos olham sempre pra mim, me despindo com suas imaginações, tocando o meu corpo de maneira ilusória e fazendo outras coisas mais que não quero entrar em detalhes, até porque não estou junto quando eles fazem o que fazem e não me interesso em saber como funciona.

Mas, enfim, nunca me interessei por ninguém. Ser desejada é fenomenal, mas desejar alguém me parece algo tão piegas. Quer dizer, o problema não é o namoro, afinal, eu poderia ficar com alguém se quisesse. O problema é o fato de que ninguém é perfeito o bastante para mim. Ninguém. Observem-me e concordem, sou linda demais para qualquer um desses garotos da escola.

Até esse exato momento.

Lá vem ele no corredor, O MENINO! Alto, magro na medida certa, carregando uma atitude que nenhum outro ser do sexo masculino tem por aqui... E o que é mais legal: ele também entra na moda. Atentem ao fato de que o cabelo dele está penteado de forma descola, erguido para cima como uma tocha negra acesa, as roupas descoladas, influenciadas pelo que se usava na década de 80, calça skinny, tênis All Star, colete jeans rasgado, minha nossa, ele é perfeito! Não consigo me imaginar ao lado de mais ninguém!

Quer dizer, ele poderia tirar os piercings que ostentam em grande número a sua orelha, mas, fora isso, tenho certeza de que está tudo certo. Ele é o cara certo para mim e não pode ser mais de nenhuma garota além de mim! Ninguém!

Caminho na direção dele no corredor e a cada passo percebo que nasci para ele. Eu simplesmente fui feita na moda do amor dele. Eu sou a tendência dele, eu sou quem ele procura, e ele vai me encontrar, e seremos felizes, o casal mais lindo da escola, aquele que sabe tudo sobre moda e tudo sobre tendências, aquele que completa um ao outro como a tampa e panela, aquele que...

- Olá, Jeferson - falei, parando-o no corredor. Afastei os cabelos para trás no intuito de fazer um certo charme.

- Olá, Angélica - ele respondeu de maneira esquisita. - Algo em que eu possa te ajudar?

- Sim. Tenho algo para lhe falar e não quero ser interrompida, portanto, ouça até o fim.

Ele assentiu com a cabeça.

- Eu nasci para você, Jefferson, e mais nenhuma outra menina dessa escola merece você se não for eu mesma! Agora, com licença - agarrei o pescoço dele e o puxei para um beijo. Ele não hesitou, e aceitou o beijo que levou cerca de dez segundos para terminar. Feito isso, continuei: - E então, o que me diz?

- Ahn... Posso te falar uma coisa?

- Qualquer uma - respondi, esperando o momento de selamento do nosso relacionamento.

- Não conte pra ninguém ainda, mas eu sou gay.

Choquei-me contra uma parede de concreto.

- Eu não quis falar com ninguém ainda, acho muito cedo. Mas o beijo foi bom - ele prosseguiu.

Eu não tinha o que falar.

- A propósito, amei o seu casaco. Você se veste muito bem, quem sabe não daria certo de fazermos faculdade de moda juntos, hein?

- Não quero fazer faculdade de moda com você! - esbravejei e me retirei.

Ele é gay...?, eu repetia em pensamento. Parecia mentira demais para mim. Será que era o destino pregando uma peça em mim? Quer dizer, eu desejei tão fortemente que ele não fosse mais de nenhuma garota além de mim e, de fato, isso parece que aconteceu. Será que não nascemos um para o outro?

Ele que se dane. Ainda vou encontrar um macho que gosta de moda, assim como eu, e, junto, vamos ser o casal mais lindo, bem vestido e etc do mundo. Eu não preciso de você, Jeferson!

~~~~~~
Bom, pra quem já ouviu a música, deve ter percebido as fortes referências à "Fashion of His Love", da Lady Gaga. Acontece que eu gostei tanto dessa música, não por causa da letra unicamente, mas por causa da melodia meio anos 80, que me senti inspirado o suficiente para criar uma história sobre. Espero que tenha ficado boa. Se tiver alguma música que queira transformar em conto, é só dizer.

sábado, 28 de maio de 2011

O Imperfeito vs O Perfeito



Oh, lá vai ela...

A GAROTA da balada. Linda, os cabelos negros como seria os da Branca de Neve se de fato existisse, a pele bronzeada, resultado do sol que tomara em uma viagem recente à praia. Meu deus, estou longe dela agora, mas, mesmo daqui, consigo imaginar como deve estar perfumada. Quer dizer, ela sempre anda assim, não é uma menina de não se preocupar com a aparência. É tão vaidosa que chega a ser doentio.

E lá vai ela cruzando o salão lotado, as luzes passando por seu corpo vestido, aliás, que corpo perfeito! As mãos que se movimentam conforme a música esbarram nela a todo momento, mas duvido que esses toque sejam de todo inocentes. Ou será que os homens que por ali estão são burros o bastante para não aproveitarem a estadia da garota e lhe arrancarem algumas lascas? Eu mesmo o faria se estivesse naquela situação.

Ela está se aproximando de um rapaz que aparentemente está esperando com ela. O cara é um rapaz boa pinta, digo, não que seja bonito, mas tem uma presença legal, uma simpatia desigual, que, querendo ou não, o torna um cara bonito. Não vou ser hipócrita comigo mesmo para não admitir isso. Até porque ninguém consegue ouvir pensamentos, então, pra mim, posso dizer com toda certeza: aquele cara É melhor do que eu.

Ela anda até ele sorrindo, os cabelos esvoaçando, brilhando de alguma maneira misteriosa. Aliás, seu sorriso brilha. Deve ser o encanto que possui que lhe dá essa aura de deusa tão poderosa. Assim que finalmente chega ao rapaz, ela lhe concede um beijo na bochecha. O rapaz, apesar de perceber que o beijo, inicialmente, é amistoso, ao se afastar, abre um sorriso um tanto malicioso. Confesso que senti raiva dele, afinal, as intenções dele para com a moça estão totalmente claras no seu sorriso!

Eu nunca que conseguiria ganhar dele em um embate amoroso. Se amássemos a mesma pessoa, ele certamente ganharia de mim. É o que o destino diz! Além de ser um cara bonito e charmoso, ele é inteligente, trabalhador, um bom companheiro, um excelente amigo. Não há quem não seja cativado por ele. Existem horas em que eu acho que ele é gay, afinal, céus, as meninas o rodeiam como se ELE fosse o tal deus de que estou falando! É revoltante!

E eu, o que sou? Um canalha. Nunca me apeguei a nenhuma menina. Não sou inteligente. Não pretendo crescer em qualquer carreira, só quero trabalhar para ganhar o dinheiro para comprar as minhas coisas e fazer minha vida, não quero estudar, tenho raiva e professores - já gritei com vários nas aulas que tive, não consigo segurar a minha inquietação - e tudo o que quero pra minha vida é felicidade, nem que ela seja encontrada naquele cigarro de maconha que fumo quando o estresse se apossa de mim.

Eu sou um cafajeste, mas sei que a felicidade, nesse momento, está naquela menina que anda tão graciosamente. Ela se despediu do rapaz e está vindo na minha direção. O seu sorriso está maior do que nunca. Ela vai falar comigo. Ela vai falar comigo.

Ela pegou no meu ombro e me beijou com ternura. Eu agarrei seus cabelos e a puxei mais pra perto, beijando-a com todo meu amor, e ela me permitia, como se já tivéssemos intimidade, como se já nos conhecêssemos há dias!

E de fato nos conhecemos. Prazer, essa garota perfeita é a minha namorada. E o cara simpático é apenas um amigo dela.

Pra você ver o que o destino prega peças nas pessoas. Eu, o imperfeito, com a garota mais perfeita do mundo, que preferiu a mim do que ao homem perfeito. Quem disse que é preciso ter todos os traços bons que a sociedade prega para conseguir o que se quer de verdade? Olha aí, nem fiz esforço e estou com a melhor menina do mundo!

quarta-feira, 25 de maio de 2011

Um Zumbi Apaixonado 2


Ele olhava para ela e ela, para ele.

Z, o zumbi, estava de frente para aquela que, tinha certeza, era a sua alma gêmea. Não que a moça fosse um zumbi - não era -, mas a sua mente, um pouco danificada por conta dos instintos zumbis que lhe foram concedidos assim que adiquiriu a "doença", lhe dizia algo similar a isso, como se insistisse que ele devesse ao menos tentar avançar em cima da garota, embora não para comer seu cérebro, como dizia a regra.

A garota, muito bonita, diferentemente da outra vadia que havia abandonado o pobre zumbi, fora simpática ao aceitar o convite de Z para uma conversa. Não que houvesse tido um convite formal, por telefone, carta ou qualquer coisa assim - Z não tinha capacidade de fazer essas coisas. O que aconteceu foi que, enquanto andava cautelosamente em direção a sua casa, a garota havia sido abordada pelo zumbi. O convite, que estava escrito no olhar nojento do zumbi, só fora aceito depois de algumas guarda-chuvadas bem acertadas na cabeça do morto.

Embora aparentasse estar tranquila, a garota não estava.

Tinha medo do que os instintos do zumbi a sua frente pudessem lhe causar. Quer dizer, até então, tinha ouvido histórias provindas de culturas sobre zumbis que diziam que se um zumbi lhe parava no meio da rua, certamente era porque você iria morrer em seguida. Talvez fosse por isso que, até então, a garota nem mesmo tinha imaginado que as intenções de Z para com ela fossem totalmente diferentes das que imaginava.

Zumbis não amam, dizia seus valores morais.

O olhar caído de Z a fitava com nenhum sentimento aparente, entretanto, seus lábios se moviam com expectativa, como se quisessem... como se quisessem...

Oh, meu deus, ele quer me beijar!, a garota pensou, espantada. Não conseguia acreditar no que seus olhos viam. Mas a pior parte ainda estava por vir.

- E-eu... T-te... amo - disse a moribunda voz de Z.

A garota arregalou os olhos de tal maneira que até mesmo Z achou aquilo estranho. Levando a mão ao peito, ela mal podia acreditar no que seus ouvidos ouviam. Quer dizer, deveria haver algum erro, talvez aquilo não fosse um zumbi, fosse apenas alguém fantasiado como tal, tentando enganá-la como naquele programa da MTV, o Punk'd. Não havia outra explicação.

Se bem que, meu deus, esses ferimentos parecem tão reais... Olhe como esse olho pende sobre o seu rosto! E esses dedos tortos, quebrados, esse maxilar pendente, fora do lugar, e esses dentes que se parecem mais grãos de milhos prontos para se soltar de uma espiga! E esse cheiro de gente morta, minha nossa, isso deve ser real! Se não for real, meus parabéns a quem criou isso!

E foi então que a mão de Z se ergueu e foi em direção a da garota, que jazia pousada em cima do seu busto.

- Não! - ela disse, sem hesitar. - Você só pode estar de brincadeira! Quem, nesse mundo, se apaixonaria por um zumbi! Oh, meu deus, você é repugnante! É doentio! Saia de perto de mim agora, não quero nada com alguém que já deixou essa vida e ainda insiste em "viver", mesmo com esse seu rosto horrível! Com licença!

De maneira histérica, a garota saiu correndo e gritando.

Se tivesse lágrimas e um pouco de orgulho, Z, certamente, estaria chorando.

terça-feira, 24 de maio de 2011

Um Zumbi Apaixonado


O zumbi não sabia o seu nome, nem mesmo a mulher que estava sobre ele nesse exato momento. Por conta disso, e por conta da impessoalidade que existe em amar alguém que não tem nome, ela, bondosamente, passou a chamá-lo apenas de Z. Ele não tinha nenhum sentimento especial por esse nome - aliás, nem sabia para que servia. Mas para ela isso era de suprema importância.

Z aprendeu a amar. Não se sabe por quê. Há teorias de que o vírus que o infectou na mordida de um outro zumbi houvera sofrido uma metamorfose, como os vírus são sempre capazes de fazer. Entretanto, isso é apenas uma hipótese, mas é a mais aceitável, já que Z consegue articular algumas poucas palavras, criar linhas de raciocínios e, decorrente disso, amar. Não um amor que envolva zelo ou nada disso, apenas um prazer em contatos corporais.

Isso significa que Z só se alimenta de cérebros humanos quando sente fome, diferentemente do restante dos zumbis, que, basicamente, só vivem para isso. Se sente fome, mata qualquer um que encontrar em meio ao holocausto zumbi. Isso significa que a fome que sentia entre as refeições era outra - um sentimento.

Ele queria sentir prazer.

A mulher que fazia amor com ele, cujo nome não convém citar, tinha os seus distúrbios mentais. Quer dizer, quem em sã consciência toparia de tão boa vontade permitir que um zumbi, um ser morto, a tocasse da maneira como Z fazia? É claro que ela tinha uma leve tendência à necrofilia, um doença que "favorecia" mais os homens, já que não necessariamente precisariam de um corpo vivo para fazer o que devia ser feito. Para essa garota, Z era uma benção. Poderia transar com um morto que, de fato, "funcionava". Isso a enchia de prazer de uma maneira monstruosa, com todo perdão do trocadilho.

A garota sobre Z era louca.

Agora, Z e sua garota faziam amor como nunca. A garota tinha a energia de uma jovem que era, por isso, ficava em cima do morto. Z, que só tinha energia suficiente para permitir que o ato sexual funcionasse, permanecia parado, deitado, enquanto deleitava-se com o sentimento de prazer que a relação lhe proporcionava, algo não muito forte, mas suficiente para lhe causar um certo vício naquilo.

A garota subia e descia em puro êxtase. Ela adorava aquilo! A fantasia de fazer amor com um zumbi a possuía de tal maneira que não havia homem vivo que fosse capaz de causar tamanhas emoções que sentia durante aquilo. Ali, ela se sentia viva, completa.

- Eu te amo - ela chegou a sibilar em um dado momento.

E foi então que algo pareceu errado.

Z ficou parado, confuso. Enquanto isso, a garota sentia que suas pernas estavam molhadas com algo quente. Olhou para baixo e descobriu: era sangue quente. Com horror, percebeu que o 'membro' da criatura se soltara durante a movimentação e agora jazia encaixado dentro de si. Enquanto isso, o sangue gosmento do zumbi escorria por suas pernas, sujando o colchão em que o ato ocorria.

Assustada, a garota saiu correndo do cenário, traumatizada com o que havia acontecido. Nunca imaginou que fosse sofrer algo assim. Enquanto isso, Z olhava o céu com uma atenção em particular. Sentia fome, mas não a fome que alimentara a vontade de fazer amor com a mulher que há pouco estava ali. Queria comer cérebros. Agora, não tinha mais vontade de se relacionar sexualmente com ninguém, afinal, querendo ou não, Z acabara de ser castrado.

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Esse conto é uma demonstração do que eu sinto sobre um romance entre um zumbi e uma garota normal, algo que será retratado em livro e filme por Isaac Merion, em 'Sangue Quente'.

segunda-feira, 2 de maio de 2011

Um Bom Dia ou uma Lufada de Ar?


Segunda-feira nublada pós-fim de semana bem conturbado, que me deixou bem ocupado, me impedindo até mesmo de dormir as horas necessárias de sono para que eu acorde bem. Acordar mal humorado é inevitável, pelo menos pra mim, já que não há nada que, de forma alguma, seja capaz de me conceder uma boa perspectiva do que o dia tem a me trazer. Nada.

Além do mais, estou com gripe. E dor de garganta. Estou tossindo muito. Respirar sem tossir é um obstáculo árduo que tenho enfrentado durante as minhas últimas horas (talvez meus últimos dias) de vida passadas. É um verdadeiro empecilho, uma pedra no sapato (ou deveria dizer na garganta?).

Daí vem o meu incrível mal humor. Estou tão mal humorado que estou inspirado, embora a inspiração esteja voltada para incríveis reclamações sobre a vida, cada vez mais criativas. Eu mesmo rio do que penso e do que escrevo. É tudo tão absurdo.

E eis que, enquanto reflito sobre essas coisas, alguém passa na minha frente e deseja um bom dia. A saudação veio junto com um sorriso, jovial, verdadeiro, você vê que a pessoa quis, de fato, desejar que você tivesse um bom dia.

Os acontecimentos a seguir ocorreram em uma pequena fração de segundo.

Pensei "Essa pessoa é importante pra mim?", e não obtive resposta, os olhos continuaram vidrados na tela do computador. Eu tossi.

E tossi.

Minha voz ficou falha, e eu precisava respirar para recuperar o fôlego. A pessoa passou, ainda olhando meu rosto, esperando a resposta do bom dia (o que seria um pouco egoísta, se refletirmos sobre o assunto), mas tudo o que mantive foi o silêncio.

Minha garganta pigarreava. Eu precisava respirar para colocar o meu pulmão e as secreções na minha garganta no lugar.

Não respondi. Respirei fundo uma, duas, três vezes. Fui tomado de alívio.

Se um bom dia fosse um feitiço ao invés de uma simples saudação, eu com certeza teria um bom dia, mas a pessoa que teria me enfeitiçado com isso, não. Não houve aquele que lhe desejou um bom dia, e isso pelo simples fato de quê, entre ser educado e respirar, eu preferi respirar.

Porque isso ainda me mantém vivo.