sexta-feira, 20 de janeiro de 2012

O Efeito da Sopa


Sopa.

Essa palavra muito intrigou Tereza, mãe de um jovem de dezessete anos, há algumas horas atrás. Nunca que o filho pedira sopa para o jantar em toda a sua vida. Aliás, nunca pediria, porque, assim como ela própria, o filho era obeso e isso porque, bem, eles preferiam alimentos mais gostosos do que nutritivos, portanto, os mais gordos. De qualquer forma, ela ouvira o filho mencionar uma sopa, e não havia dúvidas de que esse havia sido o seu pedido.

O filho estava na sala de estar quando disse o que disse. A mãe passara por ele com as compras que acabara de fazer, sorrindo para o garoto que nem mesmo desviou os olhos da tela do notebook que tinha no colo, e dirigiu-se em direção à cozinha. Foi então que ela o ouviu falar:

- Ah, meu deus, sopa!

A frase, a princípio, havia sido essa, mas o que Tereza ouviu foi:

- Ah, que vontade de comer sopa!

Claro, mãe protetora que era, preferia ver o filho andar com aquela imensa barriga que adquira na maioria dos seus anos de vida do que vê-lo com fome. Era capaz de fazer qualquer coisa que ele pedisse apenas para evitar que a frase "Estou faminto!" rompesse por aquela boca enorme e gorda. Por isso, se era desejo do filho, ela faria a sopa.

Sorridente, foi à cozinha e colheu os poucos legumes que achou. Eles não eram muito de comprar alimentos que não andassem ou respirassem. A geladeira tinha para mais de dez tipos de carne, em quantidade suficiente para alimentar uma pessoa solteira em três meses, mas aquela família de três pessoas as consumiam em uma semana, no máximo duas. Em meio à tanta carne, Tereza encontrou algumas cenouras machucadas e feias. Já era alguma coisa. No armário, achou batatas que quase criavam raízes e alguns chuchus. Três legumes, um verdadeiro record para uma mesma refeição dentro daquela casa. Achou que seria legal usar fubá, e já sabia onde encontrá-lo, já que aquele era um condimento que nunca faltava em suas receitas mais gordurosas. Para um começo, até que a receita da sopa prometia ser um sucesso, mas Tereza achava que faltava algo para dar gosto ao alimento.

Carne. Por que não?

Três tipos de carne foram escolhidos, as mais macias para serem facilmente cortadas em cubos e cozidas na água fervente. Mas carne cozida não agradava o paladar de Tereza, muito menos do seu filho ou do seu marido. Teria que improvisar. Em óleo quente com cebola e alho, ela fritou um pouco da carne e só então cozinhou-a com o restante dos ingredientes da sopa. O aroma exalado da panela era sedutor, mas Tereza ainda assim achava que faltava algo. Mas o quê?

Macarrão!

Cinco tipos de macarrão foram jogados na mistura quente e mexidos. A sopa era preparada numa incrível panela, que precisava de praticamente dois fogos acessos no fogão para manter-se quente. A senhora robusta mexia o alimento com força com o auxílio de uma colher de madeira, porque havia muito o que ser misturado ali. Se seu filho queria uma sopa, ele teria a sopa. E seria a mais deliciosa (e gordurosa) de todas!

O prato ficou pronto muitos minutos depois e Tereza já estava mais do que com água na boca. Então, decidiu servi-lo - mas primeiro a seu filho, que era mais importante, por ora. Afinal, não era ele quem queria tanto aquela sopa? Sem demorar mais, ela colocou uma generosa quantidade do alimento num prato que tinha quase um palmo de profundidade - portanto, uma tigela. Aquilo era pouco para o filho, mas depois ele poderia se servir de mais. Quem sabe aquela sopa não acabasse naquele mesmo dia?

Andando pomposamente, Tereza voltou à sala de estar com a tigela numa mão e um prato menor com três pães na outra. O refrigerante ela traria depois, afinal, tinha apenas duas mãos. Lá, encontrou o filho bastante pálido diante da tela do seu computador, os olhos bastante arregalados. Estava boquiaberto, também.

Ah, esses jogos de hoje, sempre tão envolventes!, Tereza pensou.

- Filho, sopa! - ela anunciou com o seu melhor e mais cortês sorriso.

- S-SOPA?! - ele repetiu estridente.

- Sim! Você não gosta?

- EU ODEIO O SOPA! - o garoto gritou de volta.

Lançando o notebook no chão com força, quebrando-o em centenas de pedaços, o garoto saiu correndo e, Tereza imaginou, correu para o quarto, onde trancou a porta com um baque. Seu choro era alto e podia ser ouvido da sala, como se ali estivesse acontecendo.

Tereza não entendeu o que estava acontecendo e jamais entenderia. Nunca mexera na internet.

Um pássaro cantou numa árvore do lado de fora e Tereza virou-se para a janela. O dia nunca estivera tão tranquilo e lindo. Nada de errado poderia acontecer enquanto aquele belo sol de verão estivesse a brilhar e pássaros como aqueles continuassem a cantar.

Nenhum comentário:

Postar um comentário